Colégio Dom Amando acusado de prática de racismo
Colégio Dom Amando é uma referência na educação da região Oeste do Pará
José Maria, vice-diretor, diz que Instituição está sendo alvo de difamação. Mais do que ambiente para a busca de informações e de comunicação, a internet se estabeleceu como espaço estratégico para debates, muitas vezes acalorados, sobre diversos temas. Em Santarém, durante a semana, um tema chamou atenção de internautas e causou muita polêmica: preconceito. Em redes sociais, algumas pessoas manifestaram-se e até mesmo direcionaram acusações ao Colégio Dom Amando sobre o caráter racista que seria fomentado na apresentação do Cordão das Pretinhas, uma dança tradicional do Festival Folclórico do educandário.
CDA REBATE ACUSAÇÕES DE RACISMO: A direção do colégio rebate as acusações e nega que haja qualquer tipo de racismo ou discriminação na apresentação folclórica ou em qualquer das atividades desempenhadas por seus alunos e colaboradores diariamente.
POLÊMICA NAS REDES SOCIAIS: As postagens fazem alusão a uma foto aonde aparecem alunos do CDA caraterizados para o Cordão das Pretinhas, dança apresentadas por meninas que se vestem como as mulheres negras no período da escravidão e acrescentam à indumentária a pintura dos corpos que é feita à base de curtiça queimada. Muitas postagens questionavam a legitimidade da prática pedagógica e aonde estavam os alunos verdadeiramente negros na escola.
José Maria, vice-diretor, nega qualquer ato de racismo dentro do colégio
De acordo com a direção, a foto em questão faz parte da agenda escolar 2016 do educandário. Cada mês da agenda traz uma foto que marca algum acontecimento ou evento referente ao período e o Cordão das Pretinhas foi escolhido para ilustrar o mês de agosto, quando acontece a manifestação folclórica no Festival. “A gente fica triste pelas postagens na internet, principalmente, por pessoas que não tem conhecimento de causa. Uma foto não vai delinear o comportamento, a postura e os valores de um colégio como o Dom Amando. Essas acusações não têm sentindo e acaba sendo até um desrespeito que pessoas desinformadas sobre a realidade do colégio, que no fundo são preconceituosas por conceituarem intensões, sem conhecimento de fatos”, declara José Maria Feitosa, vice-diretor da Instituição.
Ainda segundo o vice-diretor, o cordão das pretinhas é uma das apresentações mais importantes do nosso folclore porque representa muito a cultura local e está presente na programação do Festival desde a primeira edição. Ele ressalta que a dança trata-se de uma prática pedagógica de valorização cultural não só da cultura negra, mas, também, das demais manifestações que compõe a cultura brasileira. A caracterização das danças, a construção das barracas, a representação das comunidades fazem parte da proposta de aprendizado do evento. “Caracterizar as crianças como roupas, maquiagem ou outro tipo de indumentária faz parte de qualquer manifestação, seja de teatro, folclore, ou outro. Quando fazemos apresentações indígenas, as crianças se caracterizam de índios, quando há uma dança caipira todos vestem-se de acordo com a proposta da dança e assim vai pelas outras apresentações seja ela mexicana, japonesa, italiana e as demais, sempre buscando o mais próximo possível da realidade. Lamentamos que essas pessoas não tenham conhecimento da linha de respeito que o colégio tem por todos. Que fique bem claro a toda sociedade, que temos alunos, professores, representantes da Congregação de Santa Cruz e demais funcionários que são afrodescendentes e não há discriminação. No Colégio Dom Amando todos são iguais não só perante a lei como perante aos valores humanos também. Não marginalizamos ninguém”, disse José Maria Feitosa.
Dança das Pretinhas com alunas pintadas gerou polêmica
por parte de um grupo de pessoas
RESGATE CULTURAL: Em 1973, por ocasião, da primeira edição do Festival Folclórico do Colégio Dom Amando, um grupo de alunos e professores, liderados pela Professora Gersonita Imbiriba visitaram comunidades remanescentes quilombolas em busca das origens do movimento do Cordão das Pretinhas, que havia desaparecido dos eventos culturais da cidade. “Nesta pesquisa participaram muitos descendentes de negros, inclusive que alguns deles eram docentes do próprio educandário ou tinham alguma ligação com movimentos artísticos daquele período. E foi um estudo aprofundado sobre a caraterização e a contextualização do que a dança representa para a cultura afro-brasileira”, declara o professor e pesquisador da história do Colégio Dom Amando, Valdenir Pessoa.
Sobre a pintura do corpo, o professor explica a origem, porque até hoje ela faz parte da caracterização e de que forma é feita a contextualização. “A maioria das pessoas disponíveis que estava participando daquela primeira apresentação não eram negras, surgiu a ideia de pintar o corpo para caracterizar apenas e se tornou tradição essa pintura. Além do ensaio da coreografia há uma contextualização da manifestação, onde é lido o histórico antes da apresentação, que por sinal teve a colaboração do artista plástico Laurimar Leal, que também é descendente quilombola. Todas às vezes que há o ensaio, o professor responsável repassa esse histórico, os participantes ficam por dentro do trabalho de resgate cultural feito, cientes do que estão fazendo. Eles sabem que não é uma apologia ao racismo”, declarou Valdenir Pessoa.
Segundo Valdenir, o resultado da iniciativa deu origem a atração mais antiga do Festival, estando presente até hoje na programação do evento que está incluído no calendário oficial do Município. A dança é apresentada não só no Colégio Dom Amando como em muitas outras escolas seja da rede pública ou privada. Apesar do caráter satírico que as participantes tratam os castigos e as desumanidades da escravidão que marcam a música, o Cordão não pode ser tratado como uma ofensa. “Muitas pessoas nas redes sociais compararam a caracterização do Cordão das Pretinhas ao Blackface, uma prática racista. Mas, nesse caso, os organizadores entendem que pintar o rosto e a pele de uma pessoa branca para representar a pessoa negra, neste contexto, não deve ser considerado racismo. Diferente da prática americana, o objetivo não é ridicularizar e sim valorizar. Os alunos, negros ou não, se dedicam a pintura do corpo como se fosse um ritual, de preparar a tinta à base de curtiça queimada, de pintar-se e seguir para a apresentação”, disse o professor.
BLACKFACE: O blackface é uma técnica de maquiagem teatral, na qual pessoas brancas pintam-se de negras para imitá-las de forma caricata, o que reforça características físicas, estereotipando-as com o intuito de fazer piadas, sendo uma ferramenta utilizada no teatro, no cinema e no carnaval. A prática teatral de atores que se coloriam com o carvão de cortiça para representar personagens afro-americanos de forma exagerada, geralmente em minstrel shows norte-americanos que ganharam popularidade nos século 19. No início do século 20, o blackface ramificou-se dos minstrel shows tomando forma própria até seu fim nos Estados Unidos graças ao Movimento dos direitos civis dos negros nos Estados Unidos por contribuir para a proliferação de estereótipos em relação aos afro-americanos.
HISTÓRICO DAS PRETINHAS: O Cordão remonta ao tempo da escravidão no Brasil, pois seus cantos dolentes recordam as agruras da senzala, onde lembravam os trabalhos do dia-a-dia: arrancando a mandioca, a batata, o cará; ralando o coco, pisando o milho do que só lhes tocava o resto, o bagaço, lembravam também o desrespeito de que eram vítimas e tudo de ruim que lhes aconteciam no trabalho da roça, inclusive as surras que levavam com o chicote do feitor que não lhes poupava nenhuma parte de seus corpos, ao que chamavam de ferroadas do marimbondo, até que ficassem moribundos, ou seja, agonizantes. Mas, como não podiam reclamar e nem se defender, cantavam e dançavam à noite na senzala, para atenuar suas mágoas em forma de xaveco, que só os negros entendiam. Lembravam ainda a saudosa Angola, seu lugar de origem.
Da Redação
Fonte: O impacto
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