Coabitação inédita de 'dois Papas' gera especulações no Vaticano
Situação de Bento XVI na Santa Sé cria problemas inéditos para a Igreja. Ele deve voltar ao Vaticano como ex-Papa dois meses após renunciar.
Com a renúncia de Bento XVI, primeira de um Papa na história da Igreja Católica moderna, vai ocorrer uma inédita coabitação de "dois Papas" que provoca muitas especulações no Vaticano.
A partir de 28 de fevereiro, o dia de sua renúncia, Joseph Ratzinger viajará de helicóptero para a residência papal de verão de Castel Gandolfo, perto de Roma, onde permanecerá por dois meses. Depois, irá se estabelecer em um convento especialmente adaptado para ele dentro do pequeno Estado encravado na capital da Itália.
"Não é a preferência de todos. Um cardeal lamentou isso em uma conversa", relatou à France Presse um bispo de Roma sob condição de anonimato. "Quando ele for passear nos jardins, será que ficará acessível, ou um sistema de segurança o cercará como antes? É arriscado e caro para o Vaticano."
De acordo com o porta-voz do Vaticano, padre Federico Lombardi, o Papa pretende dedicar-se à oração e escrita e não vai interferir na ação de seu sucessor. Joseph Ratzinger chegou a declarar que "iria se esconder do resto do mundo".
Já o vaticanista Marco Politi está convencido de que o Papa levará uma vida "ascética".
"É, de qualquer maneira, uma figura muito reservada e que se distancia de todo contato com o mundo. A vida monástica, até mesmo de um eremita, convém a ele. Mesmo antes de se tornar Papa, durante os 20 anos que passou na Cúria em Roma, nunca se interessou pelas redes dentro da Cúria", observa.
Para este especialista do jornal "Fatto Quotidiano", "o fato de Joseph Ratzinger permanecer por dois meses em Castel Gandolfo prova que ele tem quer se afastar durante o conclave e das primeiras semanas de reinado do seu sucessor, para deixá-lo livre para fazer suas escolas".
Uma ideia compartilhada pelo vaticanista Bruno Bartoloni, convencido de que o futuro ex-Papa ficará de fora dos escalões superiores do Vaticano. Segundo ele, Paulo VI, Papa entre 1963 e 1978, já havia investigado a possibilidade de um Papa renunciar. Todos os consultados asseguraram não haver nenhum impedimento para o direito canônico, mas salientaram "o constrangimento que pode criar para o novo Papa".
"Tudo depende da personalidade do sucessor de Bento XVI, se quiser mudar algumas coisas, como a comunhão para casais divorciados", considerou Bruno Bartoloni.
Para explicar o local escolhido para a aposentadoria do Papa Bento XVI, alguns têm argumentado razões de saúde, o próprio Papa anunciou sua renúncia devido à sua fraqueza física, ou razões logísticas. "Se ele for instalado na Baviera (sua região de origem), o convento seria imediatamente atacado pela imprensa que entrevistaria as freiras, o açougue local', brincou Politi.
Como outros especialistas , à imagem do arcebispo Rino Fisichella, presidente do Pontifício Conselho para a Nova Evangelização, não está excluído que a aposentadoria do Papa dentro das paredes do Vaticano seja temporária.
Resta saber se a promiscuidade geográfica com o seu sucessor terá uma influência psicológica. "Morando aqui, o Papa estará em comunhão espiritual com o seu sucessor", disse o padre Lombardi, excluindo que o Papa continue a se envolver nas intrigas do Vaticano.
Particularmente preocupante, porém, é o papel desempenhado pelo secretário particular de Bento XVI, Georg Ganswein, que vai passar com ele o período no mosteiro dentro do Vaticano, mas continuará a exercer as suas funções como prefeito da Casa Pontifícia, onde ele foi nomeado em dezembro.
Para Mario Politi, há um conflito de funções, porque "o chefe do protocolo conhece todas as conversas secretas" que um Papa pode ter. É paradoxal que também seja confidente do Papa, considera o vaticanista, segundo o qual, esta situação deve durar certo tempo. Depois, o "belo Giorgio", apelido dado pelos italianos por causa de sua boa aparência, deverá escolher entre as duas funções.
Papa Bento XVI, Vaticano
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