Negar atendimento à saúde de indígenas é discriminação, alerta MPF
O Ministério Público Federal (MPF) encaminhou à Justiça Federal em Santarém, no oeste do Pará, resposta a contestação da União contra decisão judicial que torna obrigatório o atendimento à saúde de 13 povos indígenas da região independentemente de viverem em Terras Indígenas já demarcadas. O MPF considerou que as alegações da União representam discriminação contra os indígenas não moradores dessas áreas.
Para a União, a Justiça não pode se intrometer em assuntos de governo, e muito menos fazer isso em decisões liminares (urgentes e provisórias), até porque as políticas públicas para a saúde indígena não preveem o atendimento a indígenas não moradores de áreas demarcadas e não há estrutura suficiente para o atendimento reivindicado pelo MPF.
Para o MPF, a Justiça pode sim cobrar o cumprimento de obrigação básica da União, que é o atendimento à saúde, e pode sim fazer isso por meio de liminares, por ser um tema em que vidas humanas estão em jogo.
Sobre o fato de não haver previsão nem infraestrutura para o atendimento a indígenas de áreas não demarcadas, o procurador da República Camões Boaventura lembra que é justamente isso que a ação e a decisão pretendem que seja mudado.
"A União não foi obrigada a desenhar uma nova política de atendimento à saúde o que, aí sim, constituiria invasão indevida no mérito administrativo mas apenas determinou que a política pública diferenciada de assistência à saúde indígena passe a abarcar grupos que estavam sendo excluídos de maneira ilegítima e inconstitucional", destaca a resposta do MPF.
Assim como o Estado não pode implementar políticas públicas de educação que impeçam o acesso de mulheres e/ou negros, também não pode fazer distinção entre povos indígenas com terras indígenas demarcadas ou não, ou que vivem ou não nos centros urbanos, para fins de justificar o acesso à saúde, argumenta Boaventura. "Embora a União defenda sua 'discricionariedade técnica', ela não indica nenhum argumento técnico que justifique a discriminação que subjaz à política pública em litígio", diz.
"Ainda que possa se dizer que estes indígenas têm a opção de serem atendidos no SUS [Sistema Único de Saúde], isto configuraria uma verdadeira política estatal de atração dos indígenas aos centros urbanos, obrigando-os a se submeterem a um tratamento não culturalmente adequado e reforçando processos de homogeneização", completa o MPF.
Entenda o caso - Com base em ação ajuizada pelo MPF em maio de 2015, no final de fevereiro deste ano o juiz federal Victor de Carvalho Saboya Albuquerque estabeleceu prazo de 90 dias para que a União cadastre no banco de dados do sistema diferenciado de saúde os indígenas não moradores de áreas demarcadas, distribua cartões para acesso aos serviços e organize e passe a manter equipes de atendimento às comunidades.
As etnias com direitos garantidos pela decisão são: Borari, Munduruku, Munduruku Cara-Preta, Jaraqui, Arapiun, Tupinambá, Tupaiu, Tapajó, Tapuia, Arara Vermelha, Apiaká, Maitapu e Cumaruara. Desde 2001 quase 6 mil indígenas desses povos reivindicavam à União a atenção diferenciada à saúde, sem resposta.
A determinação liminar também estabeleceu que a Casa de Saúde Indígena (Casai) de Santarém deve passar a atender qualquer indígena que esteja morando na zona urbana do município, provisória ou definitivamente. O atendimento deve ser feito a indígenas das 13 etnias citadas na ação e a integrantes de quaisquer outras etnias.
Para o procurador da República Camões Boaventura, a maior virtude dessa decisão é que ela surgiu em um momento de intensos ataques aos direitos indígenas em todo o país e em uma circunstância em que o denominado processo de etnogênese é visto, equivocadamente, como um fenômeno de criação de falsos índios. Não podemos esquecer da famosa sentença judicial do final do ano de 2014 relativa à Terra Indígena Maró, também em Santarém, que, em um preocupante desapego aos postulados antropológicos mais básicos, afirmou que não havia índios na região do baixo Tapajós, declarando inexistentes etnias e determinando a anulação do processo administrativo de demarcação perante a Funai. Coincidentemente, na mesma época da publicação da liminar relativa à defesa da saúde das 13 etnias conseguimos anular essa sentença [mais detalhes em http://goo.gl/5ltVfc], o que representa, portanto, duas significativas vitórias recentes que reparam um erro histórico e extremamente opressor, oriundo tanto da sociedade quanto das autoridades constituídas", ressalta o representante do MPF.
Processo nº 0002096-29.2015.4.01.3902 1ª Vara da Justiça Federal em Santarém (PA)
Íntegra da resposta do MPF à contestação da União:
http://www.mpf.mp.br/pa/sala-de-imprensa/documentos/2016/resposta-do-mpf-a-contestacao-da-uniao-a-decisao-que-obriga-atendimento-a-saude-indigena
Acompanhamento processual:
http://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?proc=20962920154013902&secao=STM
Fonte: MPF
Para a União, a Justiça não pode se intrometer em assuntos de governo, e muito menos fazer isso em decisões liminares (urgentes e provisórias), até porque as políticas públicas para a saúde indígena não preveem o atendimento a indígenas não moradores de áreas demarcadas e não há estrutura suficiente para o atendimento reivindicado pelo MPF.
Para o MPF, a Justiça pode sim cobrar o cumprimento de obrigação básica da União, que é o atendimento à saúde, e pode sim fazer isso por meio de liminares, por ser um tema em que vidas humanas estão em jogo.
Sobre o fato de não haver previsão nem infraestrutura para o atendimento a indígenas de áreas não demarcadas, o procurador da República Camões Boaventura lembra que é justamente isso que a ação e a decisão pretendem que seja mudado.
"A União não foi obrigada a desenhar uma nova política de atendimento à saúde o que, aí sim, constituiria invasão indevida no mérito administrativo mas apenas determinou que a política pública diferenciada de assistência à saúde indígena passe a abarcar grupos que estavam sendo excluídos de maneira ilegítima e inconstitucional", destaca a resposta do MPF.
Assim como o Estado não pode implementar políticas públicas de educação que impeçam o acesso de mulheres e/ou negros, também não pode fazer distinção entre povos indígenas com terras indígenas demarcadas ou não, ou que vivem ou não nos centros urbanos, para fins de justificar o acesso à saúde, argumenta Boaventura. "Embora a União defenda sua 'discricionariedade técnica', ela não indica nenhum argumento técnico que justifique a discriminação que subjaz à política pública em litígio", diz.
"Ainda que possa se dizer que estes indígenas têm a opção de serem atendidos no SUS [Sistema Único de Saúde], isto configuraria uma verdadeira política estatal de atração dos indígenas aos centros urbanos, obrigando-os a se submeterem a um tratamento não culturalmente adequado e reforçando processos de homogeneização", completa o MPF.
Entenda o caso - Com base em ação ajuizada pelo MPF em maio de 2015, no final de fevereiro deste ano o juiz federal Victor de Carvalho Saboya Albuquerque estabeleceu prazo de 90 dias para que a União cadastre no banco de dados do sistema diferenciado de saúde os indígenas não moradores de áreas demarcadas, distribua cartões para acesso aos serviços e organize e passe a manter equipes de atendimento às comunidades.
As etnias com direitos garantidos pela decisão são: Borari, Munduruku, Munduruku Cara-Preta, Jaraqui, Arapiun, Tupinambá, Tupaiu, Tapajó, Tapuia, Arara Vermelha, Apiaká, Maitapu e Cumaruara. Desde 2001 quase 6 mil indígenas desses povos reivindicavam à União a atenção diferenciada à saúde, sem resposta.
A determinação liminar também estabeleceu que a Casa de Saúde Indígena (Casai) de Santarém deve passar a atender qualquer indígena que esteja morando na zona urbana do município, provisória ou definitivamente. O atendimento deve ser feito a indígenas das 13 etnias citadas na ação e a integrantes de quaisquer outras etnias.
Para o procurador da República Camões Boaventura, a maior virtude dessa decisão é que ela surgiu em um momento de intensos ataques aos direitos indígenas em todo o país e em uma circunstância em que o denominado processo de etnogênese é visto, equivocadamente, como um fenômeno de criação de falsos índios. Não podemos esquecer da famosa sentença judicial do final do ano de 2014 relativa à Terra Indígena Maró, também em Santarém, que, em um preocupante desapego aos postulados antropológicos mais básicos, afirmou que não havia índios na região do baixo Tapajós, declarando inexistentes etnias e determinando a anulação do processo administrativo de demarcação perante a Funai. Coincidentemente, na mesma época da publicação da liminar relativa à defesa da saúde das 13 etnias conseguimos anular essa sentença [mais detalhes em http://goo.gl/5ltVfc], o que representa, portanto, duas significativas vitórias recentes que reparam um erro histórico e extremamente opressor, oriundo tanto da sociedade quanto das autoridades constituídas", ressalta o representante do MPF.
Processo nº 0002096-29.2015.4.01.3902 1ª Vara da Justiça Federal em Santarém (PA)
Íntegra da resposta do MPF à contestação da União:
http://www.mpf.mp.br/pa/sala-de-imprensa/documentos/2016/resposta-do-mpf-a-contestacao-da-uniao-a-decisao-que-obriga-atendimento-a-saude-indigena
Acompanhamento processual:
http://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?proc=20962920154013902&secao=STM
Fonte: MPF
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