ODS 6: acesso e gestão para garantir a sustentabilidade no uso da água
A oferta de água e de saneamento básico é essencial à vida das pessoas e do meio ambiente. Mas a oferta, pura e simples, não é suficiente para garantir desenvolvimento sustentável. É o que define o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 6.
Em entrevista à Retratos nº 13, edição de novembro, o pesquisador do IBGE Bruno Perez fala sobre a necessidade de se combinarem acesso e gestão da água para garantir a sustentabilidade no uso desse precioso recurso.
Revista Retratos: Em meio a tantos objetivos importantes, o que podemos destacar desse objetivo?
Bruno Perez: O objetivo aborda a questão tanto do acesso individual à água para consumo humano e ao saneamento no domicílio, como também o impacto das atividades humanas no meio ambiente. Aborda aspectos como o estresse hídrico – que é a quantidade de agua retirada em relação à água que está disponível no ambiente – e a saúde dos ecossistemas aquáticos. Esses aspectos são bastante importantes do ponto de vista da saúde, porque a gente sabe que a água, quando não é gerida de forma segura para a população, é um vetor de doenças, com forte impacto na mortalidade infantil. Do ponto de vista do meio ambiente, a pressão da atividade humana é crescente e tem provocado impactos cada vez maiores e isso é uma questão crítica para o desenvolvimento.
Retratos: Em termos de indicadores, o que a gente consideraria um desafio?
Bruno: Dos 11 indicadores, talvez os mais relevantes sejam o de acesso à água pela população e o de estresse hídrico. No caso brasileiro, talvez o maior desafio esteja hoje na parte de esgotamento sanitário, mais do que na oferta da água. O Brasil já tem uma cobertura do acesso à água bastante elevada, mas isso não significa que nosso problema de acesso está resolvido. Mas temos mais dificuldade com o esgotamento sanitário. Temos outro desafio: em uma realidade como a brasileira, com áreas rurais mais isoladas ou menos adensadas, não há proposta de rede de esgoto, ou até mesmo de água. As pessoas terão formas de acesso individual, que podem ser inadequadas. Nas pesquisas domiciliares do IBGE, a gente tenta identificar algumas formas, mas a quantidade de informações é limitada. E as definições nos indicadores da ONU não batem com as categorias das pesquisas domiciliares do IBGE, e isso é um problema.
Retratos: Vários ODS se expressam de formas diferentes porque os países têm culturas diferentes. Haveria formas culturais de lidar com o saneamento que fossem obstáculos para termos saneamento adequado no Brasil?
Bruno: Se você olhar o ODS 6.2, na mesma meta tem vários pontos. Todos os países têm que avançar; alguns países terão que reduzir a defecação a céu aberto, por exemplo. Acho que no Brasil, devido à desigualdade regional muito grande, às vezes essas realidades também se expressam de forma diferente. Então, quando a gente olha, por exemplo, a questão da defecação a céu aberto, nacionalmente ela não é relevante, fica em torno de 3% ou 2%. Não é um número muito alto, na população mundial há países com mais de 50%. Mas, regionalmente, a proporção é elevada. No Maranhão e no Piauí, cerca de 10% da população está nessa situação. Em alguns municípios do interior desses estados, essa situação chega a mais da metade da população, semelhante ao que se verifica na Índia. Mas eu não apontaria, nesse aspecto, a cultura. Acredito estar mais ligado à questão do próprio desenvolvimento econômico, da oferta de serviços públicos, são áreas que coincidem com pobreza extrema.
Retratos: Da mesma forma, quando falamos de água, também falamos de outros fatores, como meio ambiente, saúde. Como o ODS 6 se relaciona com os outros ODS?
Bruno: Sim, ele se intercala com outros objetivos. O objetivo 11, sobre cidades, quando se fala de ter uma moradia adequada na cidade, inclui acesso à água e ao saneamento básico. Há uma série de intercessões com outros objetivos, como o de saúde, que é muito importante, e mesmo o de educação. Dentro do ODS de educação tem um indicador de acesso a saneamento, nos banheiros das escolas, acesso à agua. São vários pontos de ligação.
Retratos: Tem alguma coisa que você destacaria nesse objetivo que se relaciona com a situação do rio São Francisco?
Bruno: Na verdade, a relação do rio e da transposição se relaciona com vários indicadores. Por um lado, o acesso à água de algumas populações, que também está ligado à eficiência do uso da água e ao estresse hídrico. O problema é que, em algum sentido, às vezes uma medida que você faz para avançar numa direção vai ser refletir negativamente em outra. É um pouco evidente, pois se você aumenta a oferta da água, isso pode se refletir em estresse hídrico. Para ser sustentável você precisa olhar para todos os indicadores; se você escolher só um, ele pode estar melhorando, mas de forma não sustentável.
Fonte: Marília Loschi
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